segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Dona Joana não sabia dançar.

Dona Joana não sabia dançar

Dona Joana não sabia dançar, mas sabia falar e sorrir bastante.
Andava com dificuldade, mas andava sem a ajuda de bengala e tinha a mente lúcida.
Dona Joana não sabia dançar, mas contou-me que sabia fazer casaquinhos de lã, me falou sobre seus netos e as dúzias de casaquinhos que havia feito para eles.
Dona Joana era menina pobre, precisou cuidar dos irmãos mais novos e por isso não frequentou o mobral, mas aprendeu a escrever seu próprio nome e me disse que a melhor parte de saber ler e escrever, é não precisar pedir informação sobre qual é o ônibus que precisa pegar e o melhor de tudo, não precisava mais sujar seus dedos para marcar documentos com digitais, bastava assinar.
Dona Joana sabia assinar, o que ela não sabia era dançar.
Ela sabia lavar, passar, limpar, pintar guardanapos e contar historias.
Dona Joana quando virou moça, tinha vergonha dos rapazes, se achava baixinha demais, pobre demais e não sabia dançar.
Nas quermesses do padre Antônio, Joana era convidada especial, ajudava a cuidar das barracas e fazia os melhores doces da quermesse dizia Padre Antônio.
Dona Joana, ou joaninha para os íntimos, ficava lisonjeada por ser elogiada pelo santo padre que por sinal também tinha nome de santo.
Dona Joana cresceu, mas continuou fazendo roupas de boneca para as meninas, secretamente ela brincava também.
O seu primeiro namorado era moço serio trabalhador e tinha até uma bicicleta nova, mas o namoro durou pouco. O rapaz sempre queria fazer coisas com as quais Joaninha não concordava.
Todos se perguntavam, porque Joaninha não queria mais namorar aquele moço tão distinto e trabalhador que ainda por cima tinha uma bicicleta nova?
Dona Joana sabia o que queria, o que ela não sabia era dançar.
Depois de alguns anos sem que ninguém esperasse Dona Joana se casou.
Dona Joana foi feliz, teve filhos, trabalhou, foi mãe e dona de casa, que segundo ela mesma é a segunda profissão mais difícil do mundo.
Ser dona de casa é a segunda profissão mais difícil do mundo? – Pergunto eu.
Sim meu filho- Me responde Dona Joana apoiada em meu braço.
E qual é a primeira? Pergunto eu.
É a dos dançarinos meu filho.
Existem aqueles que precisam jogar suas parceiras para o alto e as fazer darem rodopios no ar.
Tem outra em que eles dançam com rodinhas nos pés, já imaginou meu filho?
Eu apenas meneio a cabeça concordando, afinal não tem como discordar de Dona Joana.
Dona Joana ficou viúva muito cedo, mas não se casou novamente.
Dona Joana sabia que existem coisas que não podem ser substituídas, o que Dona Joana não sabia era dançar.
Conheci Dona Joana em um asilo, disse a ela que gostaria de escrever algo sobre sua historia.
Dona Joana me disse – Mais meu filho, quem é que vai ler essas coisas de uma velha que só sabe assinar o nome e ler o nome do ônibus?
Eu apenas ri com vontade de chorar, As Donas Joanas que existem espalhadas por ai não fazem ideias de como seu jeito simples e despojado faz falta em nossos dias atuais.
Dei um grande beijo em Dona Joana e me despedi.
Depois de um mês voltei a Ver Dona Joana, e ela me perguntou:
Já escreveu?
Ao que respondi que não, pois ainda não tivera tempo.
Dona Joana fez um ar sério, coçou a cabeleira branca me olhou nos olhos e perguntou; Você pode escrever que eu adoro dança?
Claro respondi.
Eu posso escrever o que a Senhora pedir.
Escreva o que você achar melhor meu filho, eu não entendo nada dessas coisas de escrever – Disse Dona Joana entre um sorriso envergonhado.
Eu sorri e disse que o que eu gostaria de fazer era uma espécie de homenagem, e ali sentados continuamos a papear.
Ela me falou sobre sua vida, sobre seus filhos que a visitavam cada vez menos e sobre o ultimo casaquinho de lã que havia feito.
Falou sobre sonhos, pessoas, família e é claro sobre dança. Disse-me que seu único arrependimento em vida era não ter aprendido a dançar.
Eu acho que quando agente é pequeno deviam ensinar agente a dançar, do mesmo jeito que ensinam a não falar palavra feia e obedecer aos pais – Disse Dona Joana, e eu é claro concordei plenamente.
Faz cinco meses que Dona Joana ou Joaninha para os íntimos faleceu.
Dona Joana, eu prometo, que farei o possível para que o maior número possível de pessoas conheça sua historia e acredite não é apenas uma homenagem, pois precisamos cada dia com mais urgência de pessoas como você meu anjo. Digo você com toda essa intimidade, pois sei que não gostava do Senhora e sei que você vai me perdoar por tantas perguntas, é que é assim que agimos quando encontramos tesouros como você.
Dona Joana está feliz e com certeza já aprendeu a dançar.
Dona Joana era uma dessas pessoas fantásticas que agente ama de graça a primeira vista.
Ela sabia tudo sobre sonhos, criar filhos, viver, sorrir nas horas difíceis e contar historias maravilhosas.
O que Dona Joana não sabia era dançar, mas isso foi resolvido. Pois posso vê-la cercada por anjos que lhe ensinam todos os passos, nos intervalos para descanso Dona Joana conta uma de suas historias maravilhosas e todos riem a valer.
É fundamental conhecer pessoas assim.
É mais fundamental ainda depois de conhecê-las fazer mais aulas de dança.

P.J.S

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Não se pode agradar a todos... Que bom.

Não se pode agradar a todos... Que bom.

É quase natural a nossa decepção, quando vemos que de alguma maneira não conseguimos agradar a todos. Mas será que isso é realmente necessário?
Quantas vezes nos pegamos pensando em como fazer mais e melhor.
Precisamos fazer mais e melhor no emprego, afinal temos contas a serem pagas, filhos para serem criados e prazos a serem cumpridos.
Falando em filhos, quem nunca se sentiu culpado (a), por não ter mais tempo para eles?
Precisamos fazer melhor em nossas relações, afinal os relacionamentos hoje são quase de plástico, a imagem daquele casal de velhinhos simpáticos andando de mãos dadas depois de décadas de casamento, está mais em nosso imaginário do que na vida real, a prova disso é que quando vemos esta cena, ficamos de queixo caído como se aquela cena fosse surreal.
Precisamos fazer o melhor em nossas amizades, afinal os amigos da noite, das bebidas e da curtição estarão sempre por ai, mas os amigos das horas difíceis, os amigos que passam horas ao lado da cama de alguém doente ou se prontificam sempre a ajudar, seja com uma palavra, ou seja, ouvindo em silencio estes não fazem parte da lista do IBAMA, mas também estão em extinção.
Precisamos fazer sempre o melhor pelos outros, afinal nunca se sabe o que vão pensar de você.
Precisamos fazer o melhor por quem amamos, afinal se o relacionamento acabar, a culpa pode ser toda sua.
Precisamos manter guardados á sete chaves nossos segredos, afinal você pode ser condenado antes mesmo de ter tempo para se defender.
Precisamos fazer todos sorrirem, precisamos fazer com que todos notem a nossa presença, precisamos ter barriga tanquinho e pernas bem torneadas.
Precisamos estar antenados, frequentar lugares de gente bonita. (Eu nunca soube o que isso realmente significa, deve ser um lugar onde é proibida a entrada de gente feia).
Precisamos dizer que somos agitados, gostamos de aprender e não sabemos ficar parados, pois é isso que querem ouvir de você em uma entrevista de emprego. Talvez a robotização das empresas esteja robotizando também os seres humanos. Ou seja, precisamos de maquinas que trabalhem mais e de cabeças que pensem menos.
Precisamos agradar os sogros, os colegas de trabalho, os amigos e precisamos ser educados com o pessoal da cal Center, mesmo sem a mínima vontade de adquirir os produtos que nos oferecem.
A pergunta é por quê?
Porque tamanha necessidade de agradar em todas as instâncias?
Será uma maneira de ser aceito?
Será uma maneira de ser útil?
Nossos avós plantavam colhiam, fumavam seu cigarro de palha e eram felizes.
As mulheres davam a luz em casa, os moleques comiam terra e nadavam nos rios, e todos cresceram fortes e saudáveis.
Alguns homens e mulheres daquela época na maioria dos casos não sabiam assinar o próprio nome, mas sabiam exatamente o significado da palavra ética.
Nos dias atuais os problemas familiares, são resolvidos em programas de auditório e transmitidos em cadeia nacional.
O que aconteceu com aquele: Conversando agente se entende?
O que aconteceu com nosso espaço, nossa privacidade e com nossa liberdade de errar?
As pessoas estão com medo de dizer eu não sei, afinal vivemos no mundo do imediato, o prazer deve ser imediato, você precisa ser alguém de sucesso. Volto a questionar aquilo que já questionei em outras ocasiões – Qual é esse tal sucesso?
Lá fora as pessoas estão se engalfinhando, os funcionários da Foxconn, fabricantes do IPhone estão se jogando pela janela, a quantidade de profissionais afastados por estres aumenta a cada dia e nunca ouve tantas mortes causadas por ataques do coração como neste inicio de século.
Ser apenas bom, quando se pode ser excelente é sinônimo de preguiça, no entanto a autodestruição que cometemos para nos adaptarmos as cobranças do mundo e do outro é o que chamo de burrice motivacional.
Pois tudo gira em torno de ser melhor, comer melhor, viver melhor, ler um livro para fazer amigos e ler outro para descobrir o segredo da vida prospera ouvir a musica da moda, ter o carro do ultimo modelo e ser descolado.
O problema desse bem estar e dessa felicidade que se vende em livrarias, nos anúncios do horário nobre e estará em breve nas padarias e melhores lojas do ramo, é que elas são placebos de farinha que resolvem o problema de maneira temporária.
Quando se descobre que a roupa não ficou boa porque seu corpo não é como o do manequim da loja, quando se descobre que para se alimentar melhor podemos procurar a horta do seu Zé da esquina, quando o próximo capitulo da novela das oito já não é tão sedutor, quando temos uma religião, mas saímos de nossos templos de oração mais vazios do que entramos ou quando simplesmente procuramos sentido nas coisas á nossa volta e não encontramos, acredite o calendário Maia pode estar certo, e o planeta pode sim entrar em colapso a qualquer momento.
Mas pode ser que você não acredite em profecias.
Tudo bem, afinal os mais não te conheciam.
Mas o que você fará se o seu mundo entrar em colapso?
O que fará se não for o destaque da vez? E se você não conseguir o emprego dos sonhos?
Como você vai reagir quando descobrir que seu relacionamento é uma farsa que está á deriva?
Qual o comprimido que você vai tomar, quando descobrir que deu atenção demais às cobranças e esqueceu-se de você mesmo?
Talvez você se olhe no espelho hoje e não se ache bonito ou bonita o suficiente.
Esconda seus pneuzinhos, tenha medo de assumir seus medos, deixe que os outros cuidem de sua autoestima, preocupe-se sempre com aquilo que pensam ou dizem á seu respeito, escute sempre os conselhos dos sábios que vivem a sua volta e sabem exatamente como você deve viver a sua vida, deixe seus sonhos para depois afinal alguém disse que eles não valem a pena e são apenas sonhos e devaneios e descubra finalmente, que tudo que você precisa vivendo assim é do telefone de um excelente analista.
As cobranças fazem parte do trabalho e da vida, isso é fato, mas não se venda barato, não compre qualquer verdade absoluta na esquina.
Tome cuidado com péssimos amigos, comerciais que vendem felicidade fácil, políticos que prometem a salvação do mundo, ambientalistas que não plantam árvores e maconha, pois todas essas drogas fazem mal para seu cérebro.
Esta é a melhor noticia que você poderia receber hoje.
Acredite, não estará no New York Times, não estará na Folha de São Paulo e a Organização Mundial de Saúde não soltará nenhuma nota esclarecendo o assunto, a ciência talvez não de embasamento á esta descoberta, mas ela é verdadeira.
Não se pode agradar a todos e isso é bom.
Antes de cometer o ato suicida de querer agradar a todos se pergunte se tudo e todos estão agradando você.
Seja responsável, seja aplicado (a), lute pelos seus sonhos, seja feliz á sua maneira e lembre-se o homem mais feliz do reino, não pode ajudar o rei dando a ele sua camisa.
Por quê?
Porque ele era o homem mais feliz do reino, mas simplesmente não tinha camisa.

P.J.S