sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

A Carta.

A carta.

A carta chegou a minhas mãos em um dia qualquer, numa tarde qualquer.
A carta não possuía selo postal, não tinha remetente e muito menos carimbo.
A carta não trazia cartões de credito ou contas.
Ao abrir a carta, me deparei com uma folha em branco.
Nada escrito, nenhuma imagem e nenhum logo tipo.
No campo reservado para o nome do destinatário lia-se: Para você.
Isso me deixou em duvida, pois aquela carta poderia ser para qualquer outra pessoa.
Por alguns instantes fiquei ali, sentado observando aquela carta sem remetente e sem palavras.
Seria uma ameaça?
Imaginei que não, pois não tenho tantos inimigos assim.
Seria um convite?
Descartei esta hipótese, pois como poderiam te convidar para alguma coisa ou para algum lugar, sem fornecer um endereço?
Guardei a carta.
Fui viver minha vida, mergulhei no cotidiano como todo mundo faz, mas todo mundo em algum momento para, reflete e se faz perguntas, sejam elas complexas ou simples.
Nesses momentos de indagação, eu me dirigia até aquela gaveta e segurava a carta em minhas mãos.
Fazia isso como se esperasse que a qualquer momento, letras magicas surgissem daquele papel.
Guardei a carta.
Falei com alguns amigos sobre a carta.
A reação de meus amigos foi a mesma que a minha. Incredulidade.
Quem se daria ao trabalho de sair por ai enviando cartas sem remetente, ou sem conteúdo?
Guardei a carta, mas não seu conteúdo.
Resolvi carregar aquele papel em branco comigo.
É claro que me senti ridículo, não é todo dia que um homem com trabalho, filho para criar e responsabilidades resolve sair por ai com uma folha em branco que não sabe nem mesmo de onde ou de quem veio.
Guardei a folha.
Resolvi escrever na folha.
Escrevi o que via minhas impressões do mundo, escrevi coisas que tinha feito e coisas que desejava fazer.
Guardei a folha.
Peguei uma nova folha em branco, pois gostei da experiência de carregar uma comigo para fazer minhas observações do mundo e sobre mim mesmo.
Depois de aproximadamente um ano do ocorrido, eu e Roberto Silva um grande irmão, estamos sentados em um restaurante almoçando.
A conversa é sobre sua faculdade de jornalismo, ele me fala sobre suas três paixões, sua faculdade, sua esposa Clarice e sua filha de quatro anos Beatriz.
Falávamos de uma viagem que ele fez a Espanha.
Ele me disse que anos antes tinha escolhido o nome de sua filha, por conta desta viagem.
Fiquei um pouco confuso, pois a historia não batia. Afinal a filha dele já estava com quatro anos, ele viajou no mês passado. Como podia então ter escolhido um nome para sua filha há quatro anos, baseado em uma viajem que fez no mês passado?
Roberto me perguntou se eu sabia o significado do nome Beatriz.
Eu disse que sim, pois escrevendo algumas coisas me familiarizei um pouco com o latim.
Beatriz significa aquela que faz os outros felizes, respondi.
Exato me disse Roberto.
Agora vou te explicar com mais detalhes – me disse Roberto.
Fiz esta viagem para uma pesquisa da faculdade, mas a pesquisa foi uma tremenda desculpa, pois a viagem envolvia estudantes de Bacharelado em História.
Não tinha muito a ver com Jornalismo, mas tinha a ver comigo.
Viajamos para os mosteiros de Cister na Espanha.
Você conhece o local? – Me perguntou Roberto.
Sim, eu disse. O lugar é lindo cheio de verde e plantações de vinhas.
Os três mosteiros são da ordem de Cister que foi fundada na França.
Os três mosteiros são: Santes creus – Santa Maria de Poblet e Vallbona de les Monges.
Exato disse Roberto.
Já faz cinco anos que recebi uma carta – disse-me Roberto.
Achei tudo muito estranho, a carta não tinha selo, remetente ou carimbo. Tudo que veio com a carta foi uma folha em branco.
Eu não deixei transparecer, mas conhecia aquela historia.
Roberto prosseguiu – Eu não dei muita atenção ao fato, mas escrevi algumas coisas naquela folha, todas as vezes que escrevia um nome vinha a minha mente – Beatriz.
Não sei por que, mas prometi a mim mesmo que se um dia tivesse uma filha seu nome seria este.
Meses depois do ocorrido, estava procurando livros em um sebo, descobri um livro que falava sobre as lendas e folclore da Espanha, uma das lendas falava sobre os anjos que protegiam os doze lugares sagrados do mundo.
A lenda conta que os anjos protetores escreviam pergaminhos e jogavam na terra.
Os pergaminhos por sua vez vinham em envelopes, porém estes envelopes não tinham nada escrito, estas folhas de pergaminhos não tinham nada escrito.
Os anjos guardiões jogavam suas cartas contra o vento e deixavam o acaso e o vento escolher para onde as levariam.
A lenda diz, que se um dia recebermos uma carta sem remetente, sem palavras e sem carimbo e porque estamos recebendo um convite dos anjos guardiões para conhecermos um dos doze lugares sagrados da terra.
A carta também pode significar que você deve construir este lugar sagrado, que pode ser seu pico de paz, sua casa, seu casamento, seu trabalho etc...
A lenda conta que quando escrevemos em um papel em branco, estamos construindo o futuro, de acordo com nossas expectativas, e foi por isso que sempre quis fazer esta viagem, quando saímos da contramão da vida para conhecer lugares tranquilos e cheios de paz, é como se algo se renovasse em nossas vidas.
Entendeu agora porque Beatriz?
Olhei para beatriz que ao lado do restaurante brincava em uma piscina de bolinhas.
Beatriz me olhou com seus olhos gigantes e pretos, me deu um sorriso daqueles sorrisos que conhecemos bem.
Olhei para meu irmão Roberto e disse:
É claro que entendi.
Afinal o que é a vida, se não uma grande folha branca onde escrevemos nosso caminho?
O que seria o mundo sem Deus?
Ou o que seria o mundo sem a nossa fé?
O que seria o mundo sem os anjos que Deus nos envia?
O que seria nossa vida se não pudéssemos contemplar anjos que brincam em piscinas de bolinhas?

P.J. S

2 comentários:

Unknown disse...

Olá caro amigo! Td bem contigo? Espero que tudo esteja ótimo! Seu texto me cai como luvas...o nome Beatriz, ainda mais! E que esta Beatriz do seu texto e da minha vida, me vem como pura realidade....pura divindade....um presente de Deus!
A folha em branco e o envelope recebido talvez não seja parte de minha vida, mas que é parte de mim escrever e receber bençãos....oxalá seja eu sempre digna! Precisamos nos falar...por o papo em dia, afinal, eu só estou à algumas léguas de vc...rsrs.

Bjos....adorei o texto!

Fran disse...

Oiii... lindo texto. Me faz lembrar que a cada dia recebemos uma carta em branco para registrar a vida. E muitas vezes no final do dia nosso papel continua vazio... não temos como voltar a trás e nem como passar a limpo... bjs boa semana...