segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

As cartas que não foram lidas III

As cartas que não foram lidas III



Olhando para esta pequena estrada de terra, me lembro de como fui feliz aqui.
A estrada é simples, uma mistura de terra e pedregulhos, existe um ponto do qual podemos observar as montanhas ao longe.
O por e o nascer do sol, os dias de tempestades e os arco-íris que se forma depois das chuvas, tudo fica mais bonito e intenso vistos lá de cima.
O lugar tem o cheiro de todo tipo de ervas e flores, o solo é fértil.
As árvores fazem parte de toda paisagem, e parecem dar as boas vindas a quem chega.
Este é o meu mundo, este é o meu lar.
Peguei pedras pelo caminho, guardarei todas como lembrança dos lugares por onde passei. Tenho histórias pra contar.
Meu corpo esta cansado, meus pés estão doloridos, mas minha alma esta em jubilo.
O sol amigo, brilha com força hoje e me ajuda a lembrar o caminho.
Reconheço cada canto, pouca coisa mudou dês de minha partida.
Me lembro do dia em que parti anos atrás.
Precisava ver o mundo, precisava saber do que as pessoas eram feitas e foi assim que me conheci melhor.
Todos aqueles que viajaram pelo mundo, descobriram que seu principal atrativo é justamente este. Conhecer lugares, contemplar paisagens novas, respirar o ar de cada lugar percorrido e aprender com as pessoas.
Não digo que o mundo esteja cheio de sábios, mas o ser humano ensina até mesmo quando não diz nada, seja para o bem ou seja para o mal.
Ao norte da estrada, cavalos debandam, são os animais mais bonitos que já vi em minhas viagens.
A elegância com a qual correm, sua crina esvoaçante ao vento é a mais fiel imagem da liberdade que já vi.
Neste ponto da estrada, procurei com os olhos, aquilo que me faria entender que estava realmente regressando ao lar.
Em um olhar mais atento, ele surgiu entre outras árvores. Era um pinheiro majestoso, seus galhos se espalhavam por sobre as árvores menores, como se as protegessem.
Me lembro de cada detalhe do dia em que o plantei.
Em tempos de seca prolongada, eu buscava água do riacho para regalo, em pouco tempo, um casal de pássaros encontrou em seus galhos lugar seguro para fazer o seu ninho.
Meu velho amigo pinheiro estava de pé.
Os cachorros, começaram latir ao longe denunciando minha chegada.
Um deles corre em minha direção, mas não preciso me preocupar pois quem vem em minha direção é Tristão. Tristão nasceu pouco antes de eu partir, cuidei dele pois sua mãe morreu ao dar a luz, ele tem orelhas enormes e um olhar de criança que esta pedindo alguma coisa, por isso coloquei seu nome de Tristão.
Agora que o vejo mais de perto, vejo como cresceu, na verdade está enorme. Ele pula sobre meu peito e me da as boas vindas com um numero de lambidas e uma quantidade de baba, que faria qualquer um se afogar.
É impressionante como eles se lembram de nosso cheiro, de nosso rosto e se mantém fieis a nós, quando vejo a fidelidade deles penso que nós humanos temos algo a aprender com eles.
Existe um lindo canteiro de flores, isso só pode ser obra das mãos dela.
Ela tem esse Don de transformar nada em tudo.
A casa é simples vista de longe, mas tenho certeza de que está aconchegante como sempre.
Uma figura aparece na porta, o sol ilumina seu rosto. Tenho a impressão de estar vendo um anjo.
Ela usa um de seus vestidos floridos, que a deixam mais bonita do que já é.
Ela não sabe quem se aproxima.
Tenho medo que ela não me reconheça, tenho medo que o tempo tenha feito ela me esquecer, talvez tenha casado com outro.
Não trago ouro, riquezas ou presentes. Tudo que tenho é um corpo cansado e machucado.
Tenho poeira por todo o corpo, minhas sandálias estão sujas, minhas roupas esfarrapadas e minha barba está por fazer.
Talvez ela me diga que devo ir embora. Talvez esteja feliz sem mim por aqui.
Ela desce os degraus que separam a casa do resto do terreiro, me olha com curiosidade.
Gostaria de acenar com a mão, mas apenas caminho em sua direção, tenho a garganta seca, minhas pernas estão tremulas. Sinto uma espécie de medo corroer meu coração, não sei o que esperar, não sei como agir.
Seu cabelo está comprido, o vento brinca com eles. Ela é simplesmente linda.
Estamos apenas a alguns passos de distância um do outro.
Seus olhos reconheceram algo, ela leva as mãos aos olhos, ela me olha novamente com olhos arregalados, como se não acreditasse naquilo que está vendo.
Suas mãos cobrem novamente seus olhos, não sei qual será sua reação, não sei se devo me aproximar.
Um turbilhão de pensamentos invade minha cabeça.
Eu não deveria estar ali, talvez devesse ter ficado onde estava.
Alguns anos para o mundo ou para a existência, são apenas alguns anos, mas para o amor, alguns anos são como alguns séculos, pois o amor sempre tem pressa, e as pessoas sempre querem ser felizes através dele, mesmo que cometamos erros, estamos sempre tentando e buscando felicidade.
Talvez ela tenha se sentido abandonada, e por isso buscou a felicidade em outros braços.
Minha cabeça dá voltas, minha garganta esta seca.
Paro onde estou, penso em ir embora.
Eu sei que a magoei, mesmo tentando acertar. Tristão vai para junto dela, ele foi mais fiel do que eu, pois esteve por todos esses anos ao seu lado.
Penso em Aleph e Thau, um velho sábio cabalista me disse certa vez que quando estivesse em uma situação difícil, invocasse a primeira e ultima letra de seu alfabeto, pois essas eram também nomes de anjos protetores.
Disse-me ainda, que Aleph significava alegria, desprendimento e coragem, e Thau significava força, honra, discernimento e sabedoria.
Ele me dizia que o homem que anda apoiado por essas forças, só precisa trabalhar e sonhar, pois o resto sempre se tornará possível para ele.
Ela retira as mãos dos olhos, estou perto o suficiente para ver que as lágrimas correm por sua face.
Sinto que devo ir embora, não quero magoá-La novamente.
Vim de muito longe, tenho histórias para contar, mas histórias não consertam o passado.
Deus por favor tenha piedade, esse filho que não é merecedor invoca teu nome. Intercede por mim, se ela apenas me disser que está bem e feliz, eu partirei satisfeito, mas me deixe ouvir sua voz.
As lágrimas continuam a rolar pelo seu rosto.
Eu me viro de costas. Contemplo o caminho por onde cheguei, preciso retomar a caminhada.
Sinto um calafrio, as lágrimas querem cair.
Ouço uma voz doce chamando meu nome. Me viro para ela.
Ela continua chorando, mas tenta sorrir, seus braços estão abertos.
Nossos braços se encontram, sinto seu corpo junto ao meu, ela beija todo meu rosto.
Não controlo mais as lágrimas.
Ela segura meu rosto, me olha dentro dos olhos com o olhar mais profundo e sereno que já vi em toda minha vida.
Eu entre lágrimas digo:
Me perdoa ?
Ela sussurra baixinho:
Eu te amo.
Obrigado meu Deus.
Estou em casa.


P.J.S

2 comentários:

Sandra Botelho disse...

Meu Deus isso é lindo demias...
Me arrepiei...vivi o texto, fiquei na expectativa...
Mas tinha certeza que o perdão seria dado, porque quando se ama de verdade, sempre se perdoa.
Que lindo conto, que belo final feliz.
Bjos meus.

L. Damasio disse...

Obra prima!!!!!!