Um supermercado qualquer, um dia qualquer, porém um
dia de chuva que às vezes é meio melancólico, mas propício a um aprendizado
inesperado.
Setor de hortifrúti sabe-se lá Deus que horas eram
essa informação ficarei devendo, pois minha cabeça não estava para relógios.
Eu apenas escolhia laranjas.
Aproximou-se aquele milagre de Deus, aquilo que
acredito ser a comunhão perfeita entre vida vivida e experiência adquirida.
A sua pele sulcada e suas rugas na testa e nos olhos
denunciavam algo entre 70 e 80 anos.
Uma moça que estava ao seu lado perguntou – Vó como
faço para saber se as laranjas estão boas?
A jovem senhora lhe respondeu – Observe ela, apalpe
um pouco, sinta se não esta muito mole, cheire para ver se não tem cheiro de
podre, mas não dá para saber se esta doce, porque para saber temos que
experimentar.
A moça passou a fazer o que sua avó lhe aconselhou.
Observei com mais atenção.
Ela percebeu e me disse – Precisamos escolher afinal
não podemos levar coisas podres para casa, muito menos levar algo que precisaremos
jogar fora depois. Depois de dizer essas coisas ela me olhou e abriu um
sorriso.
Pude observar melhor suas rugas, seus olhos miúdos e
seu sorriso largo.
Em tempos de estética avançada, onde se falar em
rugas é quase pecado, onde envelhecer pode dar processo, pude observar aquele
sorriso maravilhoso com rugas e tudo mais.
Ela continuou sorrindo, e tenho quase certeza que
não falava apenas de laranjas, e mesmo que o tenha feito acredito que seu discurso
se aplica a cada coisa e cada decisão de nossas vidas.
Não podemos levar coisas podres para casa.
O que você anda levando para casa?
Quantas vezes compramos a preço de ouro uma vida ou
uma situação que vale menos que bananas?
Quantas vezes entendemos de maneira dolorosa que
compramos, mas não levamos, ou compramos e precisamos jogar fora?
Eu poderia dizer que ela é uma senhora experiente,
poderia dizer que suas rugas merecem respeito.
Poderia inclusive elaborar um belo texto sobre como
tratar os idosos, poderia formular uma palestra sobre os direitos dessas pessoas
por muitas vezes indefesas, mas...
Mas... A verdade é que indefeso sou eu, pois um
simples comentário sobre como averiguar a qualidade das laranjas me pós em
alerta, me fez pensar sobre minhas coisas podres, meus amigos podres, as
religiões podres, os políticos podres e as coisas que levo para minha casa, mas
em uma segunda olhada tenho desejo de joga-las fora.
Indefeso somos nós que não sabemos o valor de uma
vida bem vivida, pois quando ela esta chegando ao final tudo que possuímos são
as lembranças do que levamos para casa e daquilo que compramos sem averiguar
sua qualidade.
Aquele sorriso não merece respeito, mas sim uma
reverência.
Não sei seu nome, e provavelmente jamais saberei,
mas obrigado por ensinar seu método com as laranjas.
Dizem que apenas uma laranja estragada pode estragar
um saco inteiro, sendo assim seu método é extremamente importante.
Acredito que quando a hipocrisia social não se mete a
besta em dizer o que espera das pessoas, de seus corpos, de seu comportamento,
de seu sucesso ou quando não lhes dizem o que usar o que comer ou como se
vestir, até as rugas ficam bonitas.
Sorri de volta para ela com um aceno de cabeça.
Eu acredito que rugas podem significar anos vividos, mas não acredito que experiência se conquiste apenas
com idade, pois existe gente com muita idade pouca experiência e rabugice de sobra. Mas quando rugas se misturam a um sorriso franco e sincero, fica fácil entender algumas coisas sobre a vida.
Quando falo sobre a vida, me refiro às rugas, ao
sorriso e aos sábios conselhos, pois ninguém chega aos 70, 80, 90 ou 100 com um
sorriso daqueles sem ter passado por uma vida bem vivida, bem sofrida, bem
escolhida e experimentada.
Ouço conselhos todos os dias, ouço pessoas que
fingem possuir certa sapiência que na verdade não passa de achismo, que fazem
livre julgamento ou mesmo opinam de maneira livre sobre vidas que não vivem e
escolhas que não lhe dizem respeito. Isso realmente me entristece, pois sei que
ainda não descobriram que para saber se algo é doce precisamos experimentá- lo, e
tenho certeza absoluta, a maioria delas não sabe escolher laranjas.
Paulo Joaquim - (P.J).
Paulo Joaquim - (P.J).
Um comentário:
muito bom velho !! os amigos podres entâo muita calma nesta hora
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