sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Lava Jato no olho dos outros é refresco


Dia desses, pego uma corrida longa de táxi para o aeroporto de Curitiba. O taxista, desses bem-intencionados e todo simpático puxa conversa o tempo todo, perguntando minha opinião sobre assuntos que iam desde a tabela de classificação do Campeonato Brasileiro até a fome no continente africano.

- Mas a política no Brasil que está feia né? – Disse ele a certa altura, interrompendo no meio uma frase minha sobre o coringão.

- Está. Está feia pra caramba. Estamos no meio de uma crise...

- Esses políticos não prestam mesmo. Só querem saber de se aproveitar do povo. Ainda bem que inventaram essa Lava Jato.

- Inventaram?

- É. Esse Moro! Sabe, ele vai salvar o país. Você não acha?

- Acho que é um pouco mais complicado... Viu, aqui não é contramão?

- Só um pedacinho. Mas o Moro? Sabe, parece ser sério esse Juiz.

- Também acho. Ele atua dentro das regras e... Não estava fechado o sinal ali?

- Fechou, mas eu já estava embalado. Não dá nada não. Mas então, eu quero ver todos esses políticos presos, cara. Vai ser lindo, esse pessoal que não respeita nada.

- É, É. Viu, aqui nessa avenida não é só sessenta quilômetros por hora?

- Relaxa eu sempre ando a cem por aqui e nunca deu nada. Se ele se candidatasse a presidente eu votava nele. Ia endireitar o país. Você votaria também?

- Não sei, ele é um bom juiz. Mas para ser presidente precisa...

- Merda, olha a fila que ta aqui! Esses motoristas são muito lerdos. Vou cortar por fora.

- Mas você vai entrar na contramão e atravessar quem já estava na fila, não vai?

- Dá nada não, no trânsito tem que ser esperto. Mas então, o Moro. É Sérgio o primeiro nome dele, não é? Quero ver ele prender todo mundo. O Lula, a Dilma, o Temer, o Aécio... Tem que fechar todo mundo. Quebrou a lei, tem que ir preso.

- As regras são para todos, não é?

- Sim. Tem que seguir as regras. Se existe regra, tem que ser obedecida, porra. Lei é lei. O povo tem que parar de sofrer.

- Entendo. Olha, aqui é a faixa de pedestres. Vixe, você parou em cima!

- Dá nada não, aqui não é lugar de colocarem acesso pra pedestre. Só atrapalha o trânsito esse sinal aqui.

-Hum.

Fizemos o resto do trajeto em silêncio, pois aparentemente o motorista engatou uma conversa animada com outra pessoa, por mensagem via Whatsapp.

- Qual a companhia, doutor? - Perguntou chegando diante das portas de acesso ao saguão do aeroporto.

- Não sou doutor não. É aquela que tem nome de cor.

- Ah, beleza! Olha, não tem onde parar. Vou ficar em fila dupla aqui mesmo, não dá nada não.

- Não vai atrapalhar o trânsito?

- Os outros que esperem!


Pago o homem pela corrida e vou para a parte traseira do carro pegar minha bagagem. Em segurança na calçada, vejo o táxi se afastar, ostentando no para-choque um adesivo com os dizeres “Lava Jato. Eu apoio”.


segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Respeito é bom e os defeitos agradecem.


Antes da leitura, uma pequena pesquisa social.

Você não sabia dividir brinquedos?
Você tinha ciúmes de seus irmãos e irmãs mais novos?
Você se apaixonou perdidamente pela sua professora ou professor na 5° série?
Você amarrou uma toalha no pescoço, e fingiu que ela era uma capa e você um super-herói?
Você dormiu numa beliche e forrou a lateral imaginando que estava em uma cabana?
Você golpeou as plantas de sua mãe com um cabo de vassoura, enquanto fingia usar uma espada mágica que destruía monstros?
Você gastou tempo e uma pequena fortuna com álbuns de figurinhas que nunca ficaram completos?
Você achou que sabia tudo aos 16 anos, e resolveu desafiar seus pais e o mundo?
Você mentiu para namorar as escondidas?
Você deu importância a coisas que na verdade não tinham importância alguma?

Caso tenha respondido sim para a maioria das perguntas ou todas elas, acredite você é normal.
Pelo menos normal dentro dos padrões exigidos e pregados pela sociedade.
Normal de uma forma que talvez estejamos aprendendo a não sê-lo.
Normal de um jeito que só pode ser quem tem defeitos e comete pecados. Não falo de pecados capitais e muito menos de pecados que precisem de absolvição.
Falo de pecadilhos e defeitos que constroem aquilo que somos.
Existe em nossa cultura certa sede de padrões, cartilhas e passos para tudo e todos.
Existe um tamanho de bunda ideal, um tamanho de peito aceitável e corpos que precisam encaixar-se em certos moldes, de preferência com uma barriga tanquinho, e, é claro existe a busca pelo sucesso, seja lá qual for a sua denominação de sucesso.
Existem lugares frequentados por gente “Bonita”.
O Chá Detox da moda e a moda do supérfluo.
Em algum lugar da caminhada esquecemos o quanto é maravilhoso ser único, esquecemos que temos um jeito próprio de fazer as coisas e até mesmo de fazê-las de maneira errada.
Somos frutos de uma evolução que leva tempo.
Do primeiro choro até o túmulo uma quantidade absurda de erros, defeitos, tropeços e escolhas fracassadas é o que realmente deixará de ser esboço para torna-se aquilo que chamamos de vida.
Essa coisa de vida pronta, receitas prontas e passo a passo que leva todos ao mesmo lugar ou as mesmas conquistas é a maior estupidez de nosso século.
Eu gosto de saber que Einstein não era nenhum gênio na escola.
Que Lincoln não era um advogado brilhante.
Que a família Armstrong partiu da Escócia condenada à morte pela forca, mas foi Neil Armstrong que rumando em caravelas com destino a América dos sonhos livres embarcou em outra caravela, e em 20 de julho de 1969 foi o primeiro homem a pisar na lua.
Um sujeito que fora expulso da pensão onde morava, e viu-se forçado a morar no escritório onde trabalhava tinha como companhia apenas os ratos que eram atraídos por restos de comida, porém foi com seu pensamento criativo, observador e obstinado que ele deu vida ao rato mais famoso do mundo, sua criação chamava-se Mickey Mouse e seu criador era Walt Disney.
Os homens que criaram, escreveram os rumos da história, pintaram, descobriram e inventaram eram sábios e visionários a sua maneira, porém quando o assunto era futuro e fracasso eles sabiam o mesmo que eu e você, ou seja, nada.
Pedir uma opinião a terceiros é encontrar uma fila de profetas receosos sobre o que encontrarão na próxima esquina, mas sabedores da receita da vida pronta e dos conselhos sobre como vivê-la.
Existem debates em aberto sobre a sexualidade, sobre a cor da pele de cada um.
Existem verdadeiras guerras travadas entre direita e esquerda, discursões sobre o aborto e religiões.
Existem debates acirrados que acontecem atrás de uma tela de computador, e existe a comunicação olho no olho que morre a cada dia.
Homofobia, Neonazismo, Gordofobia, Amazônia, Estado Islâmico, Guerra da Síria, Refugiados, Muros entre Fronteiras e Testes Massivos de Misseis.
Falta falar sobre individualidade.
Falta debater a liberdade, mas não a liberdade bonita escrita num papel e impraticada na vida real.
Falta falar sobre valores que nos definem com pecados e diferenças, mas não como manada ou gado que precisa viver no mesmo pasto e comer a mesma ração.
Falta debater a beleza de ser o que se é.
Falta debater se tanto debate é abertura de mente ou fechamento de espirito.
Falta perguntar se seu discurso é baseado em liberdade ou na necessidade de que todos aceitem suas verdades e valores.
Falta entender se o debate será de mentes livres ou de cérebros cristalizados.
Falta falar sobre Deus, pois se ele criou todos á sua imagem e semelhança, teria ele usado uma forma?


P. J.








domingo, 25 de junho de 2017

A Metamorfose


Da série "só tem louco me ligando", numa manhã de sábado qualquer, eu estava trabalhando em uma ideia empolgante, quando o celular tocou. Nunca olho no identificador, acho mais interessante, em tempos de WhatsApp, saber quem está falando depois do primeiro "alô".


- Senhor Lucas? - disse a voz de uma mulher quase que gritada na minha orelha.
- É o telefone dele! - (eu sei que às vezes eu também não facilito).
- Estou ligando para falar do texto que o senhor encaminhou para a publicação XYZ.
- Legal! Você leu?
- Eu não, mas eu gostaria de lhe pedir algumas mudanças no terceiro e no quinto parágrafo.
- Mas você não leu?
- Não li.


Silêncio.



- E qual é a alteração que eu tenho que fazer?

- O terceiro e o quinto parágrafo.
- Claro. Sim! Mas qual é a alteração? É uma palavra específica, uma frase, o que incomodou no texto?
- Então senhor Lucas, a alteração tem que ser feita nessas partes que eu estou lhe passando. Preciso para hoje à tarde, ok?
- Mas moça, eu preciso que você me diga o que alterar.
- Não é evidente? Os trechos não agradaram.
- Mas você leu?
- Não. Eu não leio os textos da publicação.
- Ok, então é só eu alterar e reencaminhar o texto?
- Isso. Tem que ser pra hoje, até o final da tarde.


O relógio digital sob minha mesa de trabalho marcava 10h05. Fechei a ideia empolgante e me coloquei a trabalhar nos parágrafo que mereciam o ajuste. 



"Mas ela nem leu, cacete!".

Revi cada palavra. Mudei o conceito dos assuntos abordados em cada uma das passagens. Cortei advérbios, encurtei frases, simplifiquei a linguagem e mudei mais uma coisinha aqui e outra ali. Perto do meio dia, mandei o texto com as alterações pedidas para o e-mail indicado.

Por volta das três, o telefone toca novamente.

- Senhor Lucas?

- É o telefone dele!
- Aqui é o Antunes. Estou ligando para falar do seu texto enviado para a publicação XYZ.
- A sim, recebeu as alterações que eu mandei?
- Sim, recebemos. Mas eu estou te ligando para falar sobre o parágrafo inicial. Precisa alterar.
- Mas eu já alterei o terceiro e o quinto parágrafo como me pediram.
- Ok senhor, mas eu estou falando do primeiro. Precisa mudar.
- Você leu o texto?
- Li o primeiro parágrafo até agora. É ele que eu preciso que o senhor altere.
- E qual e a mudança que você quer?
- Não sei. Eu não gostei. Mude para algo que seja mais agradável, por favor.
- Mas isso é muito relativo. Me dê uma indicação mais precisa do que deve ser alterado.
- O primeiro paragrafo tem que mudar. Eu preciso dele alterado até o final da tarde de hoje, ok?
- Tá bom, mas só que... Alô? Alô?


Perto das quatro horas, começo a reescrever. Mudo a introdução inteira do texto e mando para o e-mail indicado. Às cinco horas, eu atendo o telefone pela terceira vez.


- Senhor Lucas?
- É o telefone dele!
- Aqui é o Flávio da publicação XYZ. Estou entrando em contato para falar do seu texto. O parágrafo quatro e a conclusão não estão de acordo, esteticamente e em estilo de linguagem, com  restante do texto. O senhor poderia verificar?
- Amigo, eu alterei o texto duas vezes já a pedido de vocês. Você chegou a ler?
- Ah não, eu não li senhor, eu só sigo ordens.
- Ok, mas por que vocês não passam todas as alterações de uma só vez?
- Senhor, eu estou lhe passando agora. Precisa ser refeito os dois parágrafos que citei.
- A estética e o estilo?
- Sim, exatamente! E eu preciso do texto ajustado até às seis horas?
- Meu Deus do Céu, cara! Tem menos de uma hora, me dá mais prazo!


Suspiro alto do outro lado da linha.

- Posso aguardar até as sete. Ajuda?

- Acho que sim. Vou trabalhar nas alterações imediatamente.


Faltando dez minutos para o final do prazo, anexo o texto ao e-mail e clico em enviar.



"Acho que agora fechou".



Exatamente às sete horas, o telefone toca.



- Senhor Lucas?

- Fala!
- Aqui é o Antônio, da publicação XYZ. Estou ligando para falar do seu texto. Infelizmente ele não se adequa a nossa proposta e por conta do prazo já avançado, teremos de descartá-lo.
- Como assim, você ficou maluco? Eu fiz todas as adequações que vocês pediram.
- Sim, mas o tema do seu material está errado. Você escreveu um texto sobre o a cultura contemporânea e suas implicações sociais, e nós queríamos um texto sobre as fases da Lua e sua influência sobre a civilização egípcia.

- Mas como assim? O pedido para a publicação, que vocês criaram e me enviaram especificava que o tema era a cultura contemporânea e suas implicações sociais. Vocês não podem mudar assim, sem avisar.
- Senhor, nós avisamos três vezes que precisava mudar. Você não se adequou, não cumpriu o prazo estabelecido. Desculpe, mas não tem do que reclamar!
- Mas vocês nunca disseram... Nunca avisara... Vocês nem sabiam o que deveria ser mudado!
- Senhor, desculpe, mas não há nada a ser feito. Da próxima vez tente cumprir o prazo estabelecido e com o tema adequado, ou então passe o texto para outro escritor fazê-lo. Talvez saia mais dentro do que precisamos.

A linha muda no final do dia, eu juro, gargalhava na minha cara.


*o nome da publicação, obviamente, foi alterado para evitar qualquer problema.

sexta-feira, 2 de junho de 2017

Desistir é Para os Fortes





Pode ser que uma terceira guerra mundial seja deflagrada por se falar em desistência num mundo cada vez mais competitivo e cheio de certezas vendidas a granel.
Desistir do que? Desistir para que? Desistir porque?
No mundo do imediatismo temos 5 passos para o sucesso, temos formulas para emagrecer. Toda loja feminina acredita ou impõe que toda mulher vista 38, todo homem sabe do compromisso inadiável em transformar sua barriga num tanquinho e toda criança aprende a ser capitalista nas gondolas de supermercados, e cada comercial feito especialmente para elas é uma espécie de curso de aperfeiçoamento em como constranger pais e mães a lhe darem presentes de atenção, carinhos tecnológicos e afagos  de brinquedos que acompanham um lanche. (Ou talvez seja o lanche que acompanhe o brinquedo).
Caso você ouse desistir de andar com a manada será inevitavelmente um fracasso, será aquele que não deu conta e que não aguentou o tranco da vida.
Aquele seu relacionamento abusivo no qual sempre existe alguém louco por amor, desde que viver esse amor seja suprir suas próprias necessidades pode durar anos de reclamações, frustrações e decepções.
Aqueles 15 anos no trabalho que você odeia, aqueles 4 anos de uma faculdade que você jogou fora, pois jamais se vê trabalhando naquilo ou até mesmo o bom e velho habito de acreditar que coisas que se repetem e patinam como carro com pneus carecas numa poça de lama possuem algum significado místico.
Na vida o que patina e se repete é algo que precisa de mudança de atitude, de posicionamento ou desistência.
Desista dos debates acalorados, eles não te movimentam, não agregam e nunca criarão frutos positivos.
Desista de relacionamentos abusivos ou que desejam moldar a sua sagrada forma a imagem e semelhança de outrem.
Desista de qualquer coisa que não o faça minimamente feliz.
Desista de brigar com a vida, ela sempre ganha de lavada.
Desista de tentar convencer, por vezes no meio de uma madrugada insone quando nossos bichos saem de debaixo da cama não convencemos nem a nós mesmos.
Desista de tentar ser gente boa, isso não dá pra disfarçar por muito tempo.
Desista de qualquer sonho no qual o roteiro não tenha sua coparticipação.
Desista de entender e concertar sua família. A origem etimológica dessa palavra gera conflito até hoje, alguns defendem seu surgimento da palavra em latim – "Fames" (Fome), já outras da palavra "Famulus" (Servente), que seriam na verdade um conjunto de escravos que um senhor possuía sob seu teto. Quando o assunto é família até a história fica torta.
É claro que tudo isso pode ficar lindo num texto, mas extremamente difícil na vida prática, mas acredite a parte prática da vida é construída por nós, a vida de prática tem muito pouco. A vida é cheia de mistérios a serem desvendados, como por exemplo porque na gaveta de meias sempre falta um par? Porque pararam de vender aquele pirulito de doce de leite do zorro? Porque você pode dar uma palestra sobre tudo, e ao lado de uma pessoa que você acha interessante seu parco português engasga? Porque o homem é o único animal que cora?
Os porquês desses mistérios encheriam dezenas de pagina.
As certezas estão cada vez mais cambiáveis, os planos infalíveis estão sempre insistindo em não serem afinal tão infalíveis assim.
Desista meu caro, desista minha cara. Recomece, lave tudo com bom humor ou lágrimas, sofra o tempo que for necessário, purgue de dentro para fora e aperfeiçoe o voo.
Mas lembre-se de poucas, mas sinceras verdades.
01 - Aquelas balas que parecem um dadinho de amendoim são deliciosas.
02 – A politica jamais poderá melhorar se não formos seres mais políticos e menos partidários.
03 - Religiões não funcionam se você não possuir religiosidade.
04 - Não importa quantas vezes você leia esse texto, ele pode simplesmente não fazer o menor sentido pra você, e acredite, esta tudo bem.
05 – Por último e não menos importante, quando pensar em desistir repense, pese os prós e os contras, mas caso essa seja a alternativa restante liberte-se, desista e recomece sem um pingo de pudor, vergonha ou duvida.
Para vislumbrar melhor o mundo, por vezes o melhor a se fazer é olha-lo do planeta que orbita dentro de você.

P. J.

sábado, 29 de abril de 2017

Escritor Publicado


Acho que os diálogos mais estranhos acontecem comigo por telefone. Como há uma recorrência de uma comunicação pouco efetiva e quase sempre surreal começo a pensar se existe um “jeito certo” de conversar por meio desse artefato maravilhoso criado por Alexander Graham Bell e eu ainda não saquei como utilizar essa técnica.

Esse aqui aconteceu hoje comigo. Por volta das 19h o telefone toca, e eu atendo sem olhar o identificador.

- Eu falo com o Lucas? – Perguntou uma voz rouca e pastosa.

- Sim, aqui é ele.

- Você faz um texto pra mim?

- Eu posso fazer sim.

- É que eu preciso de um texto e me falaram que você pode fazer um.

- Olha, eu tenho alguns tabus textuais. Dependendo sobre qual assunto é o conteúdo que você precise, eu não escrevo não!

Seguro a risada.

- Eu quero um conto medieval.

- Como é? Um conto medieval?

- Sim, com cavaleiros, espadas e muito sangue.

- Desculpe a pergunta, mas pra que você quer um texto medieval com espadas e sangue?

- E por que você quer saber?

- Nada. Por nada não. Bobagem. Você sabe com quantas palavras você precisa do texto?

- Não sei moço. Quantas palavras cabem em cinco folhas?

- A4?

- Não, sulfite.

- Cabem bastante na verdade. Tem alguma formatação especial que o texto precise seguir?

- Sim. Deve ser organizado em parágrafos, com diálogos e interação entre personagens.

- Entendi. Você vai publicá-lo em algum concurso ou coisa do gênero?

- E você precisa saber disso?

- Ajudaria. Eu poderia ter alguns parâmetros para entregar-lhe um material mais adequado ao que você precisa.

- Não, não! Eu quero que seja medieval e não adequado.

- !

- Você escreve pra mim?

- Em quanto tempo você precisa do texto?

- Consegue me enviar algo amanhã?

- Oi?

- Amanhã seria bom.

- Olha, eu não consigo escrever tão rápido. Não consegue me dar uma semana?

- Tudo isso? Não, eu preciso pra amanhã antes do almoço. Você não tem nada pronto aí não?

- Não tenho. Eu vou precisar criar do zero.

- Mas uma semana é muito tempo! Aí você me quebra.

- Poxa vida! Eu queria mesmo te ajudar, mas nesse prazo, fica difícil eu conseguir produzir algo com qualidade pra você. Até admito que eu escrevo um pouco devagar, mas mesmo assim, pra amanhã eu não dou conta não.

- Cara, isso é preguiça. Se você diz que escreve, então era pra criar um texto como esse em meia hora. Falta vontade pra você. Beira a vagabundice.

- Como é?

- Por sua culpa vou perder o prazo pra enviar minha história para a Antologia dos Cruzados* e não vou ser reconhecido como escritor pelo pessoal.

- Você escreve?

- Não. Mas eu ia pagar você pra escrever pra mim e publicar no meu nome. É a mesma coisa, o que conta é ter o texto no livro com meu nome embaixo.

- Entendi.

- Obrigado por nada, amigão! – Falou da forma mais irônica que conseguiu – Por sua falta de vontade, deixou de faturar trintão. Tchau.

A linha silenciosa me sussurrou mansamente algumas reflexões sobre competência e sobre noção das coisas. Talvez eu esteja precisando de um pouco das duas. Ou não. Ou sim. Me custou “trintão” não saber.


*O nome da antologia foi alterado para não expor ninguém a nada.

quinta-feira, 13 de abril de 2017

#OMartelodasBruxas


O Malleus Maleficarum, ou simplesmente “O Martelo das Bruxas” foi publicado no ano de 1486, na Alemanha, com objetivo de servir como manual de combate aos praticantes de heresia, tornando-se o guia dos inquisidores a partir do século XV. Dividido em três partes, segundo a Wikipédia, o livro relata as propriedades do demônio e sua ligação com a bruxaria, ensina a lidar com os malefícios do dia-a-dia e, claro, faz um detalhamento de como proceder com o julgamento e execução das sentenças dos acusados.

Quem assistiu ao filme The Crucible (As Bruxas de Salém, no título em português) teve uma ideia de como as coisas aconteciam naquela época, ainda que Hollywood tenha romanceado a questão, principalmente no que se refere à sede desenfreada que as pessoas tinham em acusar de bruxaria aquelas que não pensavam de forma igual a elas, utilizando o artifício como forma de se livrar de um adversário ou simplesmente pelo prazer de ver as fogueiras terem um motivo para serem acesas.

E por que eu gastei dois parágrafos inteiros para falar disso nesse texto? Simples: não consigo deixar de ver uma associação entre a prática de acusação feita no período da Santa Inquisição e o ódio disseminado amplamente, cada dia mais, nas redes sociais, onde se tenta destruir a imagem das pessoas pelos seus atos, muitas vezes, feitos sem o menor resquício de maldade ou intenções demoníacas.

Para ilustrar o que falo, vamos aos exemplos: Bel Pesce, conhecida empreendedora jovem, palestrante e impulsionadora de reflexões acerca da realização pessoal e profissional cometeu um erro. Não vou relatar aqui, pois acredito que a maioria conhece o caso. Quem não conhece, o Google está aí, em posse de todo o histórico para consulta. Pois bem, ela cometeu um erro, e ainda que tenha reconhecido a falta, recuado e pedido desculpas, teve sua vida revirada e exposta, com pessoas comentando com propriedade de causa toda a história de vida da moça – como se tivessem vivido tudo aquilo por ela – e, o que é mais interessante e característico do comportamento de ódio pelo ódio, recusando-se a ouvir o lado da garota. Como consequência, sua imagem foi queimada na fogueira do julgamento social com hashtag e tudo.

Mais recentemente, tivemos o caso com o professor e historiador Leandro Karnal, que em passagem por Curitiba, teve a oportunidade de jantar com o juiz Sérgio Moro. Embalado pelas praticas atuais, clicou o momento e postou em sua página no Facebook. Foi o bastante para atrair o ódio de uma multidão que jura ter um manual com instruções claras sobre com quem as pessoas devem ou não compartilhar uma alegre refeição, e ainda por cima, com credenciais de aprovar ou não a divulgação desse momento. Ainda que não tenha adentrado na fogueira propriamente dita, o professor sentiu o peso desse ódio, ao ponto de excluir a publicação, admitindo depois que excluí-la foi um erro e não tornará a fazer isso novamente em eventuais ocorrências similares. Claro que essa declaração fez com que as tochas fossem levantadas ansiosas por uma oportunidade de acenderem a madeira.

O caso mais recente é sobre a figura do empresário, apresentador e patrão Silvio Santos, em um diálogo com sua funcionária Rachel Sheherazade, onde o animador é acusado de assédio moral, machismo, deselegância, etc, etc, etc. Quão satisfatório seria, para os militantes do ódio, conseguirem queimar um figurão como o dono do Baú, não? Seria o carnê da felicidade quitado e premiado, até que o próximo alvo fosse escolhido para alimentar o fogo. O descontrole. A ignorância e a tirania desenfreada.

Quero deixar claro que não é uma questão de gostar ou não das figuras que citei como exemplo. Escolhi essas, pois repercutiram na mídia em escala maior, mas se olharmos com cuidado será visto que isso acontece o tempo todo, em diferentes níveis nas redes.

Estamos vivendo, no Brasil, a era da inquisição europeia adaptada aos novos tempos, onde os próprios acusadores são também os juízes e carrascos.


Com essas palavras, eu já me adianto em explicar que não estou acusando lados. Aliás, engana-se quem pensa que o ódio tem lados. Esquerda ou direita, isso é ilusão. O ódio é, em uma teoria particular, uma forma das pessoas se satisfazerem com a queda do outro. Com a destruição e angustia infligida ao próximo. É uma forma de diversão, enquanto o fogo queima e destrói aquilo que elas queriam ser, mas não foram capazes de alcançar, seja a pessoa azul ou vermelha.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Dizem Por Ai.


Dizem por ai que você deve desejar tudo que puder, que a busca do sucesso virou prioridade absoluta, mesmo que o significado de sucesso seja relativo e você ainda não tenha descoberto o que ele significa pra você. Dizem inclusive que existem receitas para fazê-lo, 10 dicas para isso, 05 passos para aquilo e 15 maneiras de realizar seus sonhos.
Dizem por ai que choro virou sinônimo de fraqueza, que tristeza trata-se com tarja preta e solidão é coisa de gente depressiva.
Dizem por ai que é preciso ter o que mostrar que gabaritos prontos devem produzir pessoas preparadas para a vida, dizem isso como se vida fosse uma roupa feita sob medida, e criaturas humanas saíssem de uma espécie de forma que nos torna todos iguais.
Gosto da chance de errar sem usar manuais, gosto da possibilidade de virar em cada esquina sem saber o nome da rua ou a previsão do tempo.
Gosto até mesmo da duvida, mas dizem por ai que duvida é coisa de gente insegura.
Gosto da solidão, esse momento tão meu, onde a conversa é cara a cara, o drink é suave e encontro coisas ao meu respeito que havia deixado num canto qualquer, cheias de poeira e mofo, mas que depois de uma faxina mental ficam novas em folha.
Dizem por ai, que brigas por partidos políticos talvez resolvam a política e talvez a falta de democracia em respeitar posições diferentes politize ás pessoas.
Andam atacando diferenças e crenças, andam caluniando o que é diferente e abençoado o ódio nosso de cada dia.
A vida, e o tempo que pouco se importam com todas essas bobagens seguem seu rumo á passos firmes.
A vida fica mais leve por conta das coisas que caem pelo caminho, coisas que eram de extrema importância já não causam a mesma pressa, coisas que eram inegáveis são postas em duvida e sentimentos que nos deixavam acordados fazem parte de uma lembrança qualquer e o sono é tranquilo.
O tempo fica mais curto, o sorriso fica mais fácil. O desapego e o desinteresse são mais praticáveis e as escolhas são mais seletivas.
Só mesmo Deus pra ter uma sacada genial dessas, parece até que estou o ouvindo dizer:
- Vocês ficarão velhos, a pele se enrugará, a coluna se envergará, seus olhos perderão a acuidade e sua saúde definhará com a morte celular, mas eu prometo que a cada ano serão mais sábios e mais leves.
Seja pelo amor, pela dor, pela necessidade, pelo espiritual ou pelo nosso próprio bem estamos condenados a evoluir.
Falo sobre não desejar estar sempre na dianteira de coisa alguma, numa corrida de cavalos na qual não apostamos.
Falo de não ser pior e nem melhor, mas de ser apenas o que se é.
Dizem por ai que é preciso se fazer esforço para isso ou aquilo, mas francamente a preguiça deve ter me pego de jeito.
Não gosto de fazer esforço, gosto de amar de graça, gosto de aperto de mãos firmes, gosto de amar por um olhar, por conta de um sorriso ou uma gentileza. Amor e amizade com esforço é comida sem tempero, sapato apertado, pão sem manteiga, praia sem sol e amizade sem abraço.
E o esforço para ser gentil? Esforço para sorrir? Esforço para engolir? Esforço para fingir? Sem falar no esforço de trocar de mascara a cada ocasião, tem gente por ai que vive em clima de carnaval o ano todo, é um verdadeiro baile de mascaras.
Dizem por ai que é ‘A’ quem esta com a razão, mas ‘B’ foi quem deu a informação, enquanto ‘C’ chegava de mansinho na contramão e foi justamente por isso que ‘D’ não conteve sua indignação, falou mal de ‘E’ que da história não sabia um tostão, pois estava preocupado com ‘F’ que quebrou seu coração.
Dizem por ai que sabem exatamente do que você precisa para ser feliz, do que você precisa para superar toda sorte de adversidades e medos. Dizem inclusive que existe uma espécie de passo a passo, uma receita, uma seta e direção. Falta só dizer quem criou mais esse tipo de alienação.
Se for preciso uma dose de sofrimento sofra e purgue ele de dentro para fora, se é necessário lágrimas, deixe que caíam. Se for necessária uma higiene mental ou espiritual faça a sua maneira, mas não deixe de purgar, não engula coisas que te envenenam aos poucos, e te matam lentamente.
Somos assim, guerreiros e destemidos, covardes e amedrontados. Hora protetores e hora aqueles que precisam de proteção, somos heróis e vilões, mocinhos e bandidos e no final das contas estamos tentando acertar um alvo que só é visto por nós mesmos.
Dizem por ai que é melhor confiar desconfiando, andar pela sombra, que seguro morreu de velho, que gato escaldado tem medo de água fria e macaco velho não põe a mão em cumbuca.  É como um dia de campeonato, o estádio esta lotado, os times preparados e as bandeiras tremulam ao vento, mas o placar é 1x0 para a vida antes do inicio da partida.
Não é o que dizem que me preocupa tanto, mas a velha pergunta do poeta Leandro Gomes de Barros que questiona:
Por que existem uns felizes
E outros que sofrem tanto?
Nascemos do mesmo jeito,
Moramos no mesmo canto.
Quem foi temperar o choro
E acabou salgando o pranto?

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

G 20.


Certo dia aconteceu uma pequena reunião.
O proposito era traçar planos e metas para o futuro.
Os animais se reuniram logo ao por do sol, e se puseram a debater.
Desculpem-me, esqueci-me de mencionar que o texto era sobre animais, porém qualquer semelhança com o mundo dos humanos não é mera coincidência.
Uma coruja com dois doutorados fez uma abertura dinâmica, com frases cheias de efeito e uma retorica impecável.
Logo em seguida foi dada a palavra ao papagaio, que por sua vez fez todo tipo de reclamação a cerca da situação.
A preguiça dormia tranquilamente e impassível.
Os macacos faziam o que era típico de sua espécie, pulavam, gesticulavam, faziam macaquices e quando ninguém estava olhando atiravam cocô.
O tucano lançou mão de seus óculos, limpou a garganta e se preparou para tomar a palavra.
O G20 dos bichos era um troço organizado e os trabalhos aconteciam de maneira ordeira, o maior problema, no entanto eram justamente os problemas, pois eram sempre os mesmos.
O tatu queria mais espaço e liberdade para cavar suas tocas.
As tartarugas achavam que o mundo globalizado e a tecnologia iam a passos rápidos demais.
O bicho preguiça pedia a paz mundial, afinal não era possível se dormir com aquele barulho.
As onças pintadas lutavam pelo direito de se pintarem de preto e se transformarem em panteras.
Os papagaios prometiam um protesto que fecharia a Avenida Paulista, pelo direito de serem respeitadas como araras.
O cachorro do mato, não pode deixar de escapar o comentário que deixou todos perplexos. Ele disse que nos últimos anos levava uma vida de cachorro.
O leão que era o rei de tudo resolveu que deveria ser elaborada uma lista com metas claras. Depois que a tal lista estivesse pronta, todos deveriam colaborar com o FMB –(Fundo Monetário dos Bichos).
Uma anta do mato pediu a palavra, e alegou com argumentos fortes que o uso de tal verba deveria ter como prioridade, os bichos mais pobres e aqueles que estivessem na parte de baixo da pirâmide da cadeia alimentar.
A anta foi aplaudida de pé depois de dizer o óbvio.
O canário que era um bicho emergente, falou sobre sua preocupação de que a crise respingasse em outras florestas.
Um barulho foi ouvido e todos se voltaram para ver o que acontecia.
Na entrada a águia e o burro se aproximavam ambos conversavam descontraidamente sem tomar conhecimento dos olhares desdenhosos.
Os olhares tinham motivo, afinal o burro e a águia chegavam sempre atrasados.
A águia foi logo se explicando.
- Me desculpem, mas todos sabem que o pico onde construí meu ninho fica a léguas de altura e todas as montanhas menores do vale foram desapropriadas para o assentamento dos sem ninhos.
Em seguida foi à vez do burro.
- Bom eu não moro tão longe assim, mas sempre me perco no caminho. Na verdade não entendo o porquê todos os anos o local de reuniões muda. Isso complica sobremaneira meu deslocamento.
A coruja pediu silêncio para que pudessem prosseguir com a reunião.
Alguém perguntou pelo mico leão dourado. O senhor tamanduá explicou que dada à situação da família do mico que desaparecia a cada dia, o mico havia reduzido suas saídas da arvore a no máximo reuniões de condomínio.
A reunião prosseguiu.
Houve um debate sobre a situação dos bichos aquáticos, que desejavam uma floresta só para seu povo, o que segundo aquele conselho era um absurdo, já que eles habitavam as aguas.
Outro debate acalorado foi sobre as religiões e suas praticas sociais.
Houve troca de acusações quando os macacos foram acusados pela girafa, de estarem colhendo cocos enriquecidos com urânio.
Os macacos se defenderam dizendo que os cocos eram para fins pacíficos.
A comunidade das lagartixas do Facebook começou a enviar mensagens de protesto, pois sempre eram confundidas com lagartos e para elas isso era homofobia.
O hipopótamo se prontificou a contar sua historia e explicar os danos psicológicos causados pelo bullyng.
A águia e o burro, apenas observavam.
Naquela noite, a reunião ainda contaria com a presença ilustre do elefante.
As hienas por sua vez, eram contra a presença dos elefantes naquele conselho, pois diziam que os elefantes não tinham o direito de enfiar a tromba nos assuntos da floresta.
E assim a reunião prosseguiu por alguns dias.
Você deve estar interessado nos resultados imagino.
Eu explico: Como toda e qualquer reunião que existe apenas para que cada um cuide de seus próprios interesses e as pedras de seu sapato, essa também não deu em nada.
Quando o assunto principal do discurso são as nossas dores, nossas dificuldades e aquilo que não temos ou não realizamos, o resultado será sempre o mesmo improdutividade.
Podemos enxergar armas de destruição em massa, podemos discordar do resto do mundo porque o resto do mundo não vive e não pensa da mesma maneira que nós.
Podemos usar o engodo da liberdade e democracia.
Podemos invadir países e matar ditadores em nome da paz. Podemos abandonar estes países sem ditadores, sem educação, sem planejamento politico e com milhares de civis mortos.
Podemos e devemos assistir de camarote o fanatismo religioso e o terrorismo fazer sua parte, nesta hora eu diria que é o momento ideal para nos preocuparmos com o que pode ‘Respingar’ no resto do mundo.
Quando os “Bichos” não vivem com seus direitos básicos garantidos e respeitados pelos tratados assinados nas reuniões de cúpula, ou mesmo não possuem acesso aos itens mais básicos de sobrevivência como comida, educação, liberdade de vida de pensamento e culto, cultura e direitos humanos que os incentivem a viver como humanos direitos acreditem, não tem G20 que de jeito nem acordo que se sustente.

Aproveito o fim deste texto para pedir desculpas aos bichos, e deixar claro meu profundo respeito e apresso por todas as espécies.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Bata nas teclas pelo amor de Deus!

Essa é a lição de hoje. E de sempre, eu acho. Quando vi essa cena pela primeira vez, pensei "é só uma cena de filme". Mas depois de ler, estudar, conversar com escritores e fazer alguns cursos de escrita, cai na real que não é só uma cena de filme. É a demonstração de uma técnica funcional e muito interessante. "Escreva com o coração. Depois, reescreva com o cérebro". Finding Forrester. Grande filme! Está entre os meus favoritos.


segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Era uma Vez...



Eu queria te contar uma historia, eu pensei no tipo clássico – Era uma vez... Etc. etc. etc.
Logo percebi que era uma vez remetia muito ao passado logo no inicio, uma vez, que era uma vez...
Fiquei confuso quanto ao inicio, mas já tinha bolado um grande final – E eles viveram felizes para sempre.
Logo percebi que para sempre é muito tempo, na verdade nem mesmo existe dentro dos termos de nossa parca compreensão.
Fiquei confuso com o fim, mas já tinha bolado um meio excelente – Ele era um herói de seu tempo, um fidalgo, quase um Quixote, uma espécie de Super-Homem.
Logo percebi que os heróis ultimamente não são unanimidade, percebi quer ser herói nos dias atuais é basicamente fazer a coisa certa, pois fazer essa tal coisa certa como simplesmente devolver uma carteira que não é sua, com dinheiro e documentos que não lhe pertencem podem leva-lo a primeira pagina.
Fiquei confuso com o meio, mas tinha umas rimas legais – Rua rimava com lua, Dor rimava com amor e tinha espaço para Flor, Sofrer rimava com Viver, mas Cantar rimava com Amar e Desejo rimava com Beijo. Tentei rimar Sonhar com Realizar, mas logo percebi a distância entre ambos.
Logo percebi que boas rimas não fazem bons contos e que poesia precisa de mais alma do que de letras. E foi assim, sem começo meio ou fim que descobri que nada tinha a contar, mas a musica que tocava em meus ouvidos era boa – Os instrumentos de sopro se harmonizavam com os metais e tinha um piano ao final que consagrava um solo desses que nos fazem viajar e desejar ouvir a canção novamente, mas e se nem todos gostassem do som de pianos?
Fiquei confuso sobre pessoas que não gostam do som de piano, mas cá entre nós existem pessoas que não gostam nem delas mesmas, me preocupei com o piano ao fundo, mas existiam outros instrumentos. Falando em instrumentos, acredito que Deus criou o mundo com musica.
Se prestarmos bem atenção podemos ouvir seus acordes enquanto ondas arrebentam no mar, apurando um pouco mais os ouvidos, podemos ouvir canções inteiras no farfalhar das árvores e no canto dos pássaros. Acredito que somos notas musicais, compomos uma orquestra. É comum sairmos do compasso e levamos anos afinando nossos instrumentos, mas quando conseguimos tocar em harmonia o mundo soa melhor.
Fiquei confuso sobre pessoas que não gostavam de musica, mas minha história também falava de dança. Tinha dança que se dançava só, tinha dança pra dançar abraçado com quem se ama e tinha aquela dança louca que desejamos fazer quando estamos na chuva.
Logo percebi que minha história não serviria para dias de tempestade, pois existem os raios e existem pessoas que têm medo deles. Pensei em colocar na história uma chuva artificial – Seria uma espécie de banho de mangueira com um sorriso nos lábios.
Fico confuso com pessoas que não riem uma vez por dia, seja o riso solto, seja o riso de si mesmo ou até mesmo o riso da tristeza resignada.
Pensei em escrever sobre mim mesmo, mas logo percebi que milhares de pessoas já fazem isso diariamente nas redes sociais.
Fiquei confuso sobre a necessidade de exposição, opinião, ódio e pontos de vistas nem sempre bem fundamentados.
Entendi que o ideal seria escrever uma bela história sobre o inicio de tudo, mas logo percebi que isso aqui ta uma bagunça, o Big Bang pode ser extinto depois do estudo do Quasar, Adão e Eva tornaram-se simplistas demais e Deus continua com seu sorriso no rosto aguardando a próxima sacada genial da humanidade para explicar a si mesma.
Fiquei confuso sobre pessoas que não entendem a si mesmas, mas desejam explicar o universo e a existência de tudo, são parecidos com aqueles parentes que você vê de vez em quando e que não são exemplos de muita coisa, mas possuem excelentes conselhos e soluções para sua vida.
Eu queria te contar uma história, tinha bolado um enredo e até construí dois ou três personagens, fiz uma estrutura funcional dos acontecimentos, mas lembrei-me da vida e de sua falta de estrutura total, lembrei que existem sim coisas programadas, porém em sua grande maioria essa coisa chamada vida chega pra nós ao sabor dos ventos.
Mudei o final, abandonei o meio e esqueci as boas rimas, mas sobrou uma frase que me seduzia, e sendo assim consegui finalmente escrever algo fabuloso. Segue o texto na integra logo abaixo:

Não era uma vez, mas era um dia. Ele ousava ser o que quisesse para viver e assim quem sabe ser feliz para sempre. FIM.



P. J. 

domingo, 8 de janeiro de 2017

O Principio e o Fim.

No principio, criou Deus os céus e a terra. A terra, porém, estava sem forma e vazia;
Havia trevas sobre a face do abismo, e o Espírito de Deus pairava por sobre as águas.
Disse Deus: Haja luz; e ouve luz.
Foi nesse momento, que todos apertaram a tecla Power de seus televisores.
Esse foi o principio da guerra pela audiência.
Valia tudo. Explorar a miséria alheia, reformar casas, mandar aqueles que fizeram o êxodo de volta pra sua terra, trancar personagens conhecidos ou não em uma casa e deixar o circo pegar fogo, visitar a casa de famosos e conversar por meia hora sobre a qualidade do mármore ou a altura do pé direito da mansão.
Tinha guerra de povão, popozudas, dinheiro na cueca ou na meia, tragédias de todo tipo e brigas entre emissoras.
O mesmo veiculo que fingia informar ajudava a desinformar.
Tinha o marketing do fique mais bonito dentro daquele carro, fique mais leve comendo este ou aquele produto, compre já este equipamento inútil que mudará para sempre a sua vida e frequente lugares de gente bonita (Particularmente nunca entendi isso, gente feia não entra? E se não entra quais são os critérios utilizados?)
A coisa chegou a tal ponto que as pessoas passavam horas em frente deste aparelho fantástico chamado televisão.
Deus estava enfurecido.
Mas a gota d’água foi quando os anjos lhe contaram que Diabo ou Satanás, como queiram, havia inventado o controle remoto.
Deus, agora muito bravo resolveu mandar todos para um jardim, e disse: De toda árvore do jardim comerás livremente, mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás; porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás.
O Diabo, Satanás ou a Serpente como queiram, que a tudo observava com sagacidade, veio ter com os homens, e lhes perguntou: Quereis ser como Deus?
É claro que todos toparam na hora.
E a Serpente, Diabo, Satanás etc... Etc...
Levou todos para comer do fruto proibido chamado computador.
Esse foi o inicio da vida virtual, em pouco tempo todos tinham blogs, twitter, instagram e facebook.
Todos tinham perfis descolados, e davam o seu melhor nas redes.
Mas eis que veio a pirataria, a pedofilia, a pornografia e era tanta coisa terminando em “ia”, que Deus resolveu acabar com a farra.
Deus expulsou todo mundo do paraíso por falta de comunicação, ninguém se falava mais, estavam ocupados demais postando, compartilhando, curtindo e dando uma espiada na vida alheia.
Deus fez um backup do lugar, baixou um antivírus e colocou senha nos arquivos.
Disse deus: No suor de teu rosto comerás o teu pão, até que tornes a terra, pois dela foste formado; porque tu és pó e ao pó tornarás.
Essas palavras foram duras, uma vez que fora do jardim a taxa de desemprego não parava de subir e voltar ao pó era um problema, pois os planos funerários custavam um absurdo.
O primeiro homicídio aconteceu junto com o segundo, terceiro, quarto e por ai vai.
Como todo mundo sabe Deus é brasileiro e o jardim ficava no eixo Rio São Paulo, por tanto, balas perdidas, traficantes brigando pelo controle dos morros e assaltos à mão armada eram comuns.
Deus viu tanta coisa errada que não teve alternativa decidiu que iria por um fim aquilo tudo.
Chamou Deus Noé, um Pernambucano arretado. (Até hoje se especula, se o mesmo era ancestral de Noel Rosa).
Disse Deus: Noé construa uma arca gigante, mas não lhe coloque o nome de Titanic, no futuro saberás o porquê.
E Noé com sua família se puseram a construir a arca.
Construir a arca para Noé e sua família que eram movidos à rapadura, farinha e buchada foi moleza o problema era colocar um casal de cada espécie na arca.
Uma das filhas de Noé passou dias procurando um casal de lagartas, quando finalmente conseguiu encontra-las elas viraram borboletas.
Um dos filhos teve sérios problemas psiquiátricos, pois todas as vezes que tentava capturar um casal de Serpentes lembrava-se da tal Serpente do Paraíso e precisou de meses e meses de análise.
Depois de muito sofrimento e muita perseguição a arca e os animais estavam prontos.
Deus então fez chover por quarenta dias e quarenta noites. (Algo muito parecido com alguns meses em São Paulo).
Depois de quarenta dias Noé soltou uma pomba, mas ela voltou.
Depois de mais alguns dias Noé soltou novamente a pomba, mas ela regressou novamente.
Esperou Noé mais alguns dias e novamente soltou a pomba, e desta vez ela não voltou. -- Diacho de pomba esperta - Pensou Noé. Deve ter achado alguma catedral ou museu e fez um ninho.
Esse foi o inicio de uma nova era e o fim do dilúvio.
O problema é que depois de descer da arca os homens se multiplicaram, o que era bom aos olhos de Deus.
Deus só não esperava que eles fossem construir uma torre com o intuito de chegar até os céus.
Deus resolveu que aquilo já era demais e sabedor de todas as coisas, sabia que todos ali falavam a mesma língua. Resolveu Deus então fazer com que falassem línguas diferentes e tal torre jamais foi concluída, pois os homens simplesmente não entendiam uns aos outros.
Satanás, Diabo, Serpente, Belzebu etc. etc. etc. Aproveitando o nicho do mercado e investiu em diversas escolas de idiomas.
Desde que tudo começou sempre foi assim. Deus conserta e constrói o Demônio vai lá e estraga e destrói (Ou Não).
Os planos de Deus no momento são mandar seus santos anjos tocarem suas santas trombetas do apocalipse e acabar com tudo de vez. Mais uma vez.
Mas eu penso que talvez nem tudo seja plano de Deus ou culpa do Tinhoso.
Talvez e apenas talvez tudo que conquistamos de bom nesta terra seja fruto como disse o próprio Deus; Do suor de nosso rosto.
Talvez quando defendemos os indefesos a luz de Deus brilhe mais forte sobre nós.
Talvez quando abraçamos nossos irmãos e lhe damos conforto nas horas difíceis Deus sorri lá de cima.
Mas talvez quando damos as costas a quem precisa uma trombeta seja tocada.
Quando nossa preocupação é sobre ter e não ser, talvez um cavaleiro do apocalipse saia a galope.
Isso tudo é só um monte de talvez.
Mas tenho certeza de que Deus não deixou seus anjos tocarem as trombetas porque acredita em cada um de nós.
Porque espera que tomemos juízo. Espera que nos amemos e nos tornemos cegos às diferenças que ele mesmo criou.
Pois eu e você podemos colocar nossas mãos juntas ou separadas para fazer e causar bem e mal, construir ou destruir.
Talvez às vezes as escolhas sejam mais minhas e suas do que de Deus ou do Diabo.
Pense nisso. Talvez um dia venha a surgir um novo céu e uma nova terra, um novo paraíso, mas como não fazemos à mínima ideia de quando isso ocorrerá porque não cuidarmos do que temos aqui e agora?
Acreditamos no Bem porque conhecemos o mal, e devemos saber que ambos habitam juntos em nosso peito.

P.J.